segunda-feira, 19 de setembro de 2011

“Óu est la liberté du non propietae?”¹

Na caneta do patrão?
 
A caneta que expropria não pode ser a mesma que liberta. Claro que camufladamente pela ideologia esta é posta, assim como foi com a ovacionada Lei Áurea da “Santíssima” Princesa Isabel. O gesto exorbitante de bondade decretou que os negros estavam livres... Só? Sim! As memoráveis palavras foram:

“Art. 1.º: É declarada extinta desde a data desta lei a escravidão no Brasil.
Art.2.º: Revogam-se as disposições em contrário.”

            Nenhuma restituição indenizatória foi dada, nenhum projeto de inserção social foi traçado e os nossos irmãos foram jogados ao bel prazer, a sua própria sorte – que por sinal, não foi tão benéfica. Esses negros continuaram explorados e seus descendentes ficaram a margem da sociedade, sem poder sobreviver por si só, tendo que vender sua força de trabalho para adquirir o seu sustento.
            Abrangendo o cenário, reconheço que existem pessoas brancas que não são ricas, e a recíproca também é verdadeira; mas essas são exceções, sendo o ideário científico o trabalho com as regras, falo assim pelo grande motivo de que a população brasileira é composta, como revelou o censo do ano 2010, de 96.795.294, isto é, cerca de 50,74%, pretos ou pardos, de um total de 190.749.191 brasileiros contados.
            No entanto, mesmo tendo mais da metade dos brasileiros como negra, constam estes em um setor desproporcionalmente alto entre os pobres: mais de 62,4% da população. A pirâmide social coloca homens e mulheres brancas no topo e homens e mulheres negras na base social (lê-se: periferia social).

Nos bens do patrão?

O burguês por deter os meios de produção possui ao alcance de seu cartão de crédito qualquer produto fetichizado³ pela mídia. Para entendermos esse processo, é importante trazer, em rápidas palavras, a origem da palavra “fetiche”. Esta provem de “feitiço”, sendo usada primeiramente em um sentido antropológico, onde seria uma transposição das propriedades divinas para algo mundano, tendo-se uma troca simbólica.
Com a mesma conotação de simbolismo, mas no sentido econômico e político, temos Karl Marx, em seu livro: “A Ideologia Alemã” com a utilidade do produto relacionada com a fantasia de se obter o objeto, isto é, a marca é levada em conta, tendo assim mais valor do que outros objetos com a mesma função, no entanto, sem o logotipo famoso estampado.
Por isto um terno, por exemplo, da Armani, ou um carro da Kia, ou mesmo uma residência na parte litorânea – mesmo com a qualidade posta na fabricação de tal mercadoria levada em conta – é superfaturada, subjetivando um desejo de endeusamento dos homens para adquiri-lo.
Mas os que não possuem essas condições continuam enfeitiçados pelas mercadorias, mesmo esquecendo que foram eles que produziram.

No salário do patrão?

            Mas se eles produziram os objetos, construíram as casas e equilibraram os carros, por que eles só possuem o desejo de tê-los? A alienação atuante dos discursos ideológicos repousa nessa hora. A expropriação dos homens em face das ferramentas para realizar o trabalho é transferida para um outro homem que é definido como o patrão. Este contrata a força de trabalho (único bem que o proletário possui), em troca de um salário... Que por sinal sofre outro processo, onde o pagamento não é justo pelas horas trabalhadas, chamando isto de mais-valia, isto é, o lucro do patrão estaria nas horas não pagas de trabalho do proletário.
            Então, logicamente, podemos perceber que pela maioria da população ser explorada o desejo de obter algo é crescente. O salário fixo de R$ 545,00 contrasta com os milhares, milhões ou até mesmo bilhões de dólares (o lucro do burguês deve ser posto assim, pelo grande fluxo internacional, onde a moeda de cálculo padrão é o dólar), recaindo assim na grande injustiça social, disparidade econômica, na qual vergonhosamente o Brasil ocupa oitavo lugar segundo dados da ONU de 2005, e vemos que não se tem uma nova propensão de mudança, pois o “deixa como está” é posto unanimemente nos discursos de controle para a manutenção da “ordem” vigente.


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¹ SALDANHA, Nelson. O que é Liberalismo?. In Estado de Direito, Liberdade e Garantias (Estudos de Direitos Público e Teoria Política). São Paulo: Sugestão Literária, 1980, p.89. – “Onde está a liberdade do não proprietário?”


² DUARTE, Alessandra. Biografia: Censo 2010: população do Brasil deixa de ser predominantemente branca. Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/mat/2011/04/29/censo-2010-populacao-do-brasil-deixa-de-ser-predominantemente-branca-924352875.asp. Acesso em: 13 de Setembro de 2011.


³ MARX, K. & ENGELS, F. A Ideologia Alemã. Trad. Castro e Costa, L. C.. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

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